Série D

Santa Cruz: Presidente do Conselho enxerga momento político conturbado como fruto de apequenamento do clube

Marino Abreu afirma que o Santa Cruz parou no tempo quanto ao crescimento do seu faturamento; dirigente afirma que só […]

Marino Abreu, presidente do Conselho Deliberativo do Santa Cruz

Foto: Santa Cruz/Divulgação

Marino Abreu afirma que o Santa Cruz parou no tempo quanto ao crescimento do seu faturamento; dirigente afirma que só torcida não viabiliza mais fazer o futebol competitivo

A atual realidade do Santa Cruz é muito difícil. Eliminado precocemente da Série D em 2023 e sem calendário nacional para o ano que vem, o Tricolor do Arruda vive uma crise sem precedentes em sua história enquanto se encaminha para se tornar uma Sociedade Anônima do Futebol (SAF).

Contudo, a SAF, que pode ser a tábua de salvação coral, também é a razão de um cisma político dentro clube entre o Executivo e o Conselho Deliberativo, que teve seu presidente afastado em junho e reconduzido ao cargo após a Justiça negar o pedido de renovação da intervenção aprovada pelo juiz responsável pela recuperação judicial.

Um dos principais personagens do embate político coral na atualidade é o presidente do Conselho Deliberativo do Santa Cruz, Marino Abreu. Eleito como vice-presidente do órgão na eleição que levou Joaquim Bezerra ao cargo de chefe do Executivo, o dirigente ocupou todos principais os cargos diretivos do clube no último ano, sendo presidente e vice do dois poderes tricolores.

Por isso, o Click Esportivo entrevistou o dirigente para traçar um panorama da situação política do Santa Cruz, que se encaminha para eleições no próximo mês de dezembro.

Entrevista com Marino Abreu, presidente do Conselho Deliberativo do Santa Cruz

Click Esportivo: Os resultados do ano de futebol do Santa Cruz foram muito ruins. Como consequência disso, o clube ficará sem calendário nacional em 2024, disputando apenas o Pernambucano. Como você vê essa situação?

Eu vejo a atual situação do Santa Cruz com muita tristeza, pois eu aprendi a amar esse clube durante toda a minha vida. Se a gente olha para o passado, em 2004 ou 2005, por exemplo, a diferença para os nossos rivais era grande, mas não era tão consolidada como é hoje. Naquela época, conseguíamos concorrer com o Sport, por exemplo, para a contratação de um jogador. Algo que atualmente não conseguimos. Vimos o Náutico se distanciar também e, enquanto isso, o Santa vai afundando nesse processo de apequenamento. Se focou muito nessa questão de política dentro do Arruda e se esqueceram de entender que o futebol mudou.

Hoje, uma torcida gigantesca como a nossa já não faz mais tanta diferença na hora de uma grande contratação. Os jogadores preferem um clube que pague em dia e que pague mais, mesmo que não possua tradição. O dinheiro virou a força-motriz do futebol.

Click Esportivo: Diante do atual contexto do clube, é impossível não pensar que o conturbado momento político e os bastidores sempre acalorados acabaram influenciando no desempenho em campo. Você acha que o contexto ruim acabou atrapalhando os jogadores?

Eu vejo que o contexto político conturbado dos últimos três anos do Santa Cruz não é a causa, mas sim a consequência dos últimos 40 anos. O clube vem se deteriorando há pelo menos quatro décadas. Contudo, eu acredito que muitas vezes quando se está vivendo o processo, é mais difícil de enxergar. Uma prova disso é que na última eleição, quando Joaquim (Bezerra) foi eleito, a chapa de situação chegou a ter 13 candidatos anunciados. Isso mostra que o Santa Cruz tem uma carência muito grande de nomes que queiram assumir o clube. Ninguém quer se envolver, pois sabe que é uma massa falida.

É um clube que trabalha com o mesmo patamar de orçamento da década de 1990, vivendo uma realidade de 2023, onde as cifras do futebol são astronômicas. Não conseguiram até hoje modificar algo que é crucial, que são as fontes de faturamento do clube. Pode vir a gestão que for, que se não mudar isso, não vai conseguir trabalhar.

Click Esportivo: Dentro do contexto político conturbado do clube, tivemos nesta reta final de Série D o seu afastamento do cargo de presidente do Conselho Deliberativo e a implementação de uma intervenção que durou dois meses com o intuito de “apaziguar” os bastidores. Agora, com a sua volta, como fica a relação entre o órgão e o presidente?

A relação entre o Conselho Deliberativo e a presidência do Santa Cruz já não existia. Já quase não nos falávamos e hoje ficou ainda pior. Faz muito tempo que não sou procurado e também não irei buscar (uma aproximação). O afastamento foi visto com bastante incredulidade. Foi um absurdo que o Judiciário corroborasse com todas as mentiras contadas, além de me tirarem do cargo sem que ao menos me ouvissem. Eu não fui escutado antes de decidirem pelo meu afastamento.

Isso mostra como é difícil trabalhar com Antônio (Luiz Neto, atual presidente do Santa Cruz), pois ele não aceita discordâncias. Ou se faz do jeito dele ou não se faz. Se você não concordar, ele vai buscar um jeito de tentar lhe exterminar. E isso é com todo mundo. Ele é um dos presidentes mais vitoriosos da história recente do clube, mas é um dos caras com a maior rejeição, seja dentro das lideranças políticas do clube ou na torcida. Para o tamanho dos feitos, é uma rejeição impressionante.

Click Esportivo: Na sua visão, o que esse tipo de atitude causa ao contexto político do clube?

Na minha leitura isso ocorre por conta do modus operandi dele. Se você não concordar com a gestão, ele vai lhe tirar da jogada de algum jeito. Foi isso que ele tentou fazer comigo, fez com Joaquim e com outras pessoas, que acabaram desistindo e renunciando de seus cargos. Fui o único que não sai. E quando ele viu que não funcionaria comigo, ele fez uma manobra jurídica, que acabou sendo revertida.

Ao fim da situação, eu vejo que isso me deu uma vantagem. Enquanto eu gritava aos quatro ventos que vinha sofrendo ameaças vindas do Executivo, muita gente duvidava, dizendo que eu queria tumultuar. Quando eu fui afastado, as pessoas perceberam que eu não estava mentindo. Por este lado, acabou sendo positivo.

Click Esportivo: O senhor é mais um a relatar ameaças relacionadas ao grupo político que comanda o Santa Cruz. Anteriormente, outros conselheiros já haviam relatado tentativas de coação, especialmente durante a campanha da Assembleia Geral Extraordinária (AGE), em maio. Como isso aconteceu em sua vivência no clube?

As ameaças ocorriam muitas vezes quando eu ia ao estádio, mas não foram só essas. Aconteceram várias vezes de maneiras pública. Inclusive, Dody (Josenildo Dody, pré-candidato à presidência do Santa Cruz para a próxima eleição) fez um vídeo na época da primeira assembleia me ameaçando. Também sofri ameaças no dia da Assembleia Geral para a modificação do Estatuto, que foi convocada por Antônio.

Nesta ocasião, eu fui cercado no local de votação. Eu fui votar e quando estava no local onde só poderiam entrar sócios e votantes, eu fui coagido por membros ligados ao Executivo, pessoas que fizeram parte da organizada, mas que hoje estão na estrutura, como colaboradores ligados ao presidente e estão presentes no dia a dia do clube. Já houveram situações de Eduardo (Cavalcanti) e outros conselheiros quase irem às vias de fato. Eu só não estive presente na confusão porque me tiraram. Enfim, foram inúmeras situações, sem contar as citações em jornais e redes sociais.

Click Esportivo: E como era a postura do Executivo quando era relatado este tipo de expediente dentro do clube?

O presidente sempre preferiu falar que era mentira minha, quando na verdade é obrigação dele e do restante do poder Executivo garantir a segurança de todo e qualquer torcedor que estiver presente no Arruda. Ele preferiu me descredibilizar do que providenciar a segurança de um membro de um dos poderes do clube. Eu tive que contratar a minha própria segurança e fico triste com essa situação.

Não há problema nenhum em discordar. Não quer falar comigo? Quer me xingar? É um direito dele. Mas partir para a agressão e para as ameaças é demais. É como se fosse a única linguagem em que eles sabem se comunicar. A língua da violência.

Contudo, isso que me fará desistir da luta junto com todo o Conselho Deliberativo. Eu não estou só. Eu só lamento pelo absurdo. O Santa Cruz virou caso de polícia quando não era para ser, mas se essa é a realidade, nós só podemos trabalhar com ela. Por isso, todas as providências que eu tive de tomar, eu tomei.

Click Esportivo: Algumas destas providências tomadas vão de encontro a pedidos que foram feitos pelo Executivo ao interventor Ricardo de Paula durante o período de seu afastamento. Como estão os trâmites para a realização destas mudanças?

Em nenhum momento, desde que assumiu, Antônio procurou dialogar com o Conselho como órgão. Não estou falando da mesa diretora. Ele nunca se preocupou em se apresentar aos conselheiros, não tentou entrar em contato com ninguém para dialogar. Pelo contrário. Ele só se preocupou em dar entrevistas e dizer que nós éramos desqualificados. Toda vez que ele abre a boca para tocar no assunto de incluir novos conselheiros, ele sempre fala que quer colocar pessoas qualificadas, juízes e magistrados no Conselho. Ou seja, para ele, só tem qualificação quem é juiz ou magistrado.

Por isso, a entrada do interventor nada mais foi do que para fazer perseguição política. O objetivo era claro: incluir os 300 de Antônio. Só que isso não temos como fazer, pois o limite de conselheiros do clube é de 500 e já temos 300 empossados. Inclusive, entre os “Conselheiros de Antônio”, 177 sequer são sócios do Santa Cruz.

Além disso, temos a situação que o próprio pleno do órgão só aceitou o aumento no número a partir da próxima eleição. Portanto, tudo o que eu venho fazendo é apenas cumprir o que é determinado pelo colegiado do órgão. Não é Marino fazendo isso ou aquilo.

Click Esportivo: Com a sua saída, a primeira AGE, que já estava marcada, acabou cancelada. Por isso, em seu retorno, uma das primeiras providências foi acolher o novo pedido para que a Assembleia seja realizada em outubro. Por que este processo é tão importante para o Santa Cruz?

Quanto à AGE, a gente não consegue entender qual o objetivo de Antônio em realizar uma SAF sozinho. Não tem uma explicação lógica. O que os conselheiros querem é simplesmente terem poder de decisão também. Não é proibir de fazer a SAF, nem do presidente negociar. Ele só precisa apresentar o negócio na Assembleia de sócios, coisa que ele se recusa e até briga na Justiça. Não temos como entender qual o intuito disso tudo. Queremos que a chance de erros seja minimizada.

O Executivo negocia e isso passa pelos sócios para que ele não dê a canetada sozinho e maximize a chance de algo dar errado. Atualmente, está todo mundo a parte do que está acontecendo. Tudo o que temos de informação é o que ficamos sabendo pela imprensa.

Click Esportivo: Para além da Assembleia Geral, outra demanda que vem ganhando força na torcida coral são os clamores para a antecipação das eleições, que serão realizadas em dezembro. Como você se posiciona?

Eu sou completamente a favor de antecipar as eleições, mas o presidente vem dando entrevistas dizendo que é contra. Eu prefiro pensar no futuro do clube. Em 2024, nós teremos apenas um campeonato e se não formos bem nele, perderemos o ano de 2025 também. O que seria um prejuízo de dois anos. Por isso, o novo presidente não pode assumir 30 dias antes do início das competições. Isso é péssimo.

É preciso ter tempo hábil para a preparação visando o Pernambucano para que a nova diretoria possa se ambientar e estruturar os seus processos. Acho que era uma coisa que deveria acontecer, mas não posso tomar essa decisão sozinho. É algo que precisa ter uma definição em conjunto entre os conselheiros e o Executivo. Contudo, como Antônio já disse que não quer, acho praticamente impossível de isso acontecer.

Santa Cruz ainda terá eleição para novo presidente neste ano
Foto: Santa Cruz/Divulgação

Click Esportivo: Sabemos que a corrida para a presidência do Santa Cruz já possui os primeiros nomes se posicionando para concorrer. Contudo, uma demanda da torcida é a renovação dos quadros. Há a possibilidade de você sair candidato?

Eu acredito que devam surgir novos nomes. Acho que irão aparecer pessoas diferentes dos que estão postos, mas não tenho como prever o que vai acontecer. Espero apenas que quem entrar bote a mão na consciência e saiba que o melhor caminho para o Santa Cruz hoje é ser negociado. Já foi provada a necessidade de se tentar um novo modelo e o Santa Cruz precisa muito mesmo dessa mudança.

Eu prefiro não dizer nunca, mas não pretendo ser candidato. Eu entrei como vice-presidente do Conselho Deliberativo e nunca imaginei que em um ano teria passado por todas as funções. Eu assumi a presidência quando Joaquim renunciou, sou presidente do Conselho e, por algum tempo, fui vice-presidente do clube. O desgaste é muito grande, seja pela função ou por tudo que passamos nesse período. Torço e espero para que a gente apareça alguém com boas condições e que possa tocar o Santa Cruz a partir do ano que vem.

Click Esportivo: Houve algum contato com algum dos candidatos já postos durante esse período inicial do pleito?

Não fui procurado para ser candidato, mas já conversei com Zé Neves e Albertino (dos Anjos), pois eles queriam ficar completamente a par da atual situação do clube. Em nenhum momento, eles me procuraram no sentido de ingressar em uma composição. Eles queriam se inteirar, pois colocaram seus nomes à disposição. Na ocasião, ambos me pediram para falar sobre o cenário atual do Santa Cruz.

Click Esportivo: Muito se fala que a SAF pode ser a salvação do Santa Cruz. Porém, o momento atual demonstra um clube com graves problemas financeiros e que vive uma recuperação judicial. Para além da compra por um grupo gestor, qual seria a solução para melhorar a realidade coral, na sua opinião?

O Santa Cruz nunca se preocupou em aumentar as suas receitas. Nos últimos 15 anos, o clube tem basicamente a mesma receita, girando entre R$ 10 milhões e R$ 15 milhões. Quinze anos significa muito tempo no futebol. Neste período, o Flamengo não é a potência que virou hoje. Deram uma reviravolta em 10 anos sempre visando aumentar seu faturamento. Enquanto o Santa Cruz não rentabilizar sua torcida, sua marca, seu estádio e sua área do imóvel, não adianta.

A venda de um jogador não será o suficiente para mudar a realidade do clube. Precisamos de constância no faturamento. O Náutico hoje já fatura quase o dobro do que o Santa Cruz e é nosso rival local. Apesar disso, eles também passam aperto. Ou seja, entre R$ 20 milhões e R$ 30 milhões pode não ser suficiente. Imagina o Santa com R$ 10 milhões. Com essa quantia não se faz futebol mais.

 

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